Quem na vida já não conheceu um mentiroso compulsivo? Eu tive um rolo há anos atrás que era assim. Não posso negar que me divertia. Cada vez que saíamos com casais diferentes, amigos diferentes, eram as mesmas histórias, mas com versões completamente divergentes. Quanta mentiiiira. Eu deixava, né? Ia desmentir o coitado na cara dura? Nada. Estavam todos se divertindo, rindo, e eram mentirinhas bobas, sem importância. Dizem que quem conta um conto, aumenta um ponto. Este aumentava pontos, exclamações, interrogações e até reticências.
Existem pessoas que mentem tanto, que quando falam a verdade ninguém mais leva fé. Nunca se sabe. Tenho uma funcionária que vive atrasando. Como ela não vai de ônibus e não pode usar o trânsito como artifício, no começo a desculpa mais recorrente era: o metrô parou. Há? Como assim? Parou? Mas você está atrasada há mais de uma hora. O metrô se pára, pára uns cinco minutos. Mais que isso gera pânico aparece no jornal, imagina. Onde parou? Em que estação? Que horas? Vou ver na internet, vou ligar para o metrô. Como ela percebeu que não colava, as desculpas mudaram. Um dia era tiroteio perto do lugar onde mora, outro dia teve dor de barriga e parou no meio do caminho inúmeras vezes para ir ao banheiro, e por aí ia. Eu dava bronca, e ficava naquela... “me engana que eu gosto”
Aí esta semana, liga ela no trabalho, dizendo que ia atrasar porque estava no hospital tomando soro. Contou que passou mal à noite, que achava que tinha sido intoxicação alimentar, blábláblá. Pensei cá comigo: An han... Sei, sei. Como eu estava ainda em casa, nem dei muita importância. Fiquei mais preocupada em organizar as coisas em função da ausência dela. Mas de repente me deu um clic, peguei o tel e falei com a outra funcionaria: - Liga pra ela agora e pede pra trazer atestado!! Ligou. “Ih, já saiu do hospital, já esta a caminho.” E a pulga atrás da orelha a esta altura do campeonato já estava tão acomodada, que já estava até querendo montar um circo.
Enfim, pensei com meus botões: Estava no hospital nada. Fala sério. Outro clic. Humm. Liguei no trabalho, e pedi: - Quando fulana chegar, cata um buraco nela! Se ela tomou soro, tem que ter um furo no braço, em algum lugar. Vê se ela tá furada! E aí pensei: - Ahhhh, dessa vez eu pego de calça curta! Olha, aos que não me conhecem, não é que eu seja carrasca nem nada, alias, sou uma chefe bem tranqüila. Mas depois de meses de atrasos constantes e desculpas esfarrapadas, não tinha mais opção: Cata o buraco nela!
Para minha surpresa, desta vez era verdade! Ela realmente tinha passado mal, coitada. E depois eu ri, lembrando a que ponto eu cheguei... - Onde está o buraco? Haha. Tava lá, inchadinho, e ela mal, fraca e até bem pálida.
Da mesma tchurma do Pinóquio, tenho uma amiga que volta e meia me deixa recados, tipo: “Me liga URGENTE!” Nas primeiras vezes caia. Ligava correndo e largava o eu que estava fazendo, super preocupada. Nada. Era alguma dúvida boba ou fofoca furada. E pior é que ela insiste até hoje. Manda SMS: “me liga urgente!!!! Preciso falar com você!!!!” An han. Já era. Ligo nada, tô ocupada. Amanhã quem sabe. Mas sempre fica a dúvida: - E se um dia ela realmente estiver precisando de mim, desesperada, pendurada num penhasco? Este é o risco de quem mente sempre: um dia não será mais levado a sério. Vai despencar ué.
Os mentirosos compulsivos seguem à risca a filosofia de um velho provérbio escocês: "Prefiro uma mentira que me favoreça a uma verdade que me prejudique." Tá bom, mas eles que agüentem as conseqüências de seus atos. Porque um dia elas virão!! Infelizmente, ou felizmente, nem todos terão a sorte do Pinóquio com um happy end. Ahh, se pelo menos o nariz crescesse... Eu juro que já me daria por satisfeita.